VOCÊ SABIA?
Atualmente, um dos produtos mais presente no hábito alimentar do brasileiro é o leite de vaca e seus derivados, como queijos, iogurtes e requeijão. A aceitação do leite de vaca como alimento completo existe desde a nossa primeira refeição, e desde a nossa primeira infância. Entretanto para podermos observar os efeitos do leite de vaca no nosso organismo devemos dissociar a ação do leite materno e do leite “não materno”.
O leite materno é o alimento mais perfeito que existe no mundo. Sua composição é específica e sutilmente modificada de acordo com a necessidade do lactente.
Em todos os mamíferos, os nutrientes e, em especial, as proteínas do leite produzido são para estimular, nesta espécie, o melhor crescimento e desenvolvimento orgânico e funcional.
Quanto mais evoluímos e a tecnologia nos oferece mais conhecimentos específicos sobre a composição e as funções do leite materno, mais esforço é despendido em relação ao aleitamento materno pelo maior tempo possível, onde já foram comprovados os inúmeros benefícios que isto trará para o resto da vida do bebê e também da mãe.
O leite materno é um líquido rico em gordura, proteína, carboidratos, minerais, vitaminas, enzimas e imunoglobulinas que protegem contra várias doenças. O leite materno é composto por 87% de água, sendo que os 13% restantes são uma poderosa combinação de elementos, fundamentais para o crescimento e desenvolvimento da criança, além de prepará-la adequadamente para aceitar e utilizar os alimentos que serão introduzidos gradualmente, a partir de um mecanismo imunológico perfeito, desenvolvido a partir das substâncias presentes no leite materno. O leite humano é rico em leucócitos e anticorpos que protegem o bebê contra infecções e alergias, possui fatores de crescimento que aceleram a maturação intestinal, também prevenindo alergias e intolerâncias. É rico em vitamina A que previne e/ou reduz a gravidade de algumas infecções e previne doenças oculares causadas por sua deficiência. Além disto, um estudo na Suécia sobre a ação da caseína dos leites humano e de vaca, demonstrou que a caseína presente no leite humano é um dos componentes que ajuda a proteger as crianças contra infecções gastrintestinais, impedindo a adesão de más bactérias como a H. Pylori às células da mucosa intestinal humana, enquanto o mesmo não ocorreu com a caseína do leite de vaca.
O leite de vaca também contém fatores imunológicos de ótima qualidade, mas para o bezerro. Esses fatores só funcionam para a mesma espécie. Mesmo que alguns destes fatores possam funcionar, serão destruídos pela armazenagem e fervura do leite.
O principal açúcar do leite materno é a lactose porém, mais de 30 açúcares já foram identificados no leite humano, como a galactose, frutose e oligossacarídeos, com ação comprovadamente muito maior do que os do leite de vaca.
O que mais diferencia o leite de vaca do humano, e por isso mesmo mais transtornos pode causar ao ser humano, é a composição de proteínas e o desequilíbrio entre os minerais.
As proteínas do leite humano são estruturais e qualitativamente diferentes das do leite de vaca. No leite humano, 80% do conteúdo proteico é de lacto albumina. No leite de vaca esta mesma proporção é de caseína. A relação proteína do soro/caseína do leite humano é de 80/20, a do leite bovino é 20/80.
A baixa concentração de caseína no leite humano resulta em uma formação de coalho gástrico mais leve, de mais fácil digestão e com reduzido tempo de esvaziamento gástrico. Além disso, o leite bovino contém a beta lacto globulina, uma proteína que não existe em leite humano e é comprovadamente a mais alergênica do leite de vaca para o ser humano, principalmente por não termos enzimas que digerem esta proteína.
Diversos estudos já demonstraram existir mais de 25 frações proteicas alergênicas em leite de vaca.
O leite humano também contém maiores quantidades de aminoácidos essenciais de alto valor biológico, como a cistina, e aminoácidos como a taurina que não tem em leite de vaca, e que são fundamentais para o crescimento e desenvolvimento do sistema nervoso central. Isto é particularmente fundamental para os prematuros que não possuem enzimas necessárias para a formação da taurina.
O leite de vaca ainda possui 3 vezes mais proteína que o leite humano, sendo chamado por alguns estudiosos de “carne líquida” 14, porém acidificando o pH sanguíneo e sobrecarregando o rim, quando consumido em alta quantidade e, ao contrário do que se imagina, aumentando a excreção urinária de cálcio.
Em um estudo em Cambridge, Reino Unido, com 926 bebês que foram acompanhados por 5 anos, foi demonstrado que quanto maior o tempo de consumo do leite materno, maior o nível de massa óssea aos 5 anos, com uma diferença de até 38% em relação aos que receberam fórmulas infantis, apesar das mesmas terem uma proporção maior de cálcio.
Tabela de Comparação do Leite Materno com Outros Leites
Leite Humano | Leite Animal | Leite Artificial | |
Propriedades
Anti-Infecciosas |
Presente | Ausente | Ausente |
Fatores de crescimento | Presente | Ausente | Ausente |
Proteína | Quantidade adequada, fácil de digerir | Excesso, difícil de digerir | Parcialmente modificado |
Lipídeos | Suficiente em ácidos graxos essenciais, lipase para digestão | Deficiente em ácidos graxos essenciais, não apresenta lipase | Deficiente em ácidos graxos essenciais, não apresenta lipase. |
Minerais | Quantidade correta/ equilibrado | Em excesso / desequilibrado | Parcialmente correto/ parcialmente equilibrado |
Ferro | Pouca quantidade, bem absorvido | Pouca quantidade, mal absorvido | Adicionado, mal absorvido |
Vitaminas | Quantidade suficiente | Deficiente A e C | Vitaminas adicionadas |
Água | Suficiente | Necessário extra | Necessário extra |
De: OMS/CDR/93.6
LEITE E DERIVADOS E ALERGIAS E HIPERSENSIBILIDADES
Inúmeros estudos demonstram a relação de leite e derivados com processos alérgicos por diversos mecanismos imunológicos3, ou seja alergias mediadas por IgE, clássica e normalmente com reações imediatas, porém essas são 1 a 2% das alergias alimentares, sendo a maior porcentagem em crianças até 3 anos.
A maior porcentagem das alergias alimentares são tardias e mediadas por IgG, principalmente, podendo desencadear sintomas de 2 horas a 3 dias após o contato com os alérgicos, sendo portanto de difícil diagnóstico. Entre os alimentos mais alergênicos, o leite de vaca é o mais frequente. Essa relação até já é feita pela maior parte dos profissionais da área da saúde atentos às causas das doenças, porém costuma-se ligar mais a intolerância à lactose. Sem dúvida esta intolerância é comum e pode desencadear transtornos funcionais gastrintestinais locais e por consequência também sistêmicos. Porém, não é a maior causa de doenças sistêmicas desencadeadas pelo leite de vaca. A maior relação dos derivados de leite com as alergias tardias se deve ao fato do organismo não digerir a beta lacto globulina. A caseína (80%), alfa lacto albumina e lacto globulina são de dificuldade digestiva, principalmente a caseína.
Todas estas reações em conjunto, podem desencadear sintomas em diversos órgãos alvo (órgão de choque), podendo se manifestar por alterações físicas, mentais e/ou emocionais.
Diversos estudos comprovaram a relação de alergia tardia, principalmente à leite de vaca com otite, dermatite, rinite, sinusite, bronquite asmática, amigdalite, obesidade, aumento da resistência à insulina, aumento na formação de muco, gastrite, enterocolite, esofagite, refluxo, obstipação intestinal, enurese, enxaqueca, fadigas inexplicáveis, artrite reumatóide, falta de concentração, hiperatividade (ADHD), dislexia, ansiedade e até mesmo depressão.
É importante entender que o processo alérgico tardio não se manifesta pela presença da substância alergênica e sim pelo consumo regular da mesma, normalmente em detrimento de uma nutrição adequada, gerando processos somatórios que favorecem o desencadeamento dos sintomas alérgicos.
BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES
O desequilíbrio entre cálcio e magnésio também favorece sintomas de carência de magnésio como câimbra, dores musculares, inchaço, dor de cabeça, cólica, tensão muscular, taquicardia, osteoporose, aumento da resistência à insulina entre outros, principalmente quando se acha que ao tomar um iogurte ou uma bebida láctea colorida, já comeu “também” a fruta, ou seja, aumento do consumo de lácteos e baixo consumo de frutas, legumes e verduras.
Além dos fatores já discutidos, a fermentação (por más bactérias e comensais) de proteína e gordura mal digerida, vai favorecer um pH alcalino no intestino que prejudica o desenvolvimento e a manutenção das boas bactérias e diminui a absorção de minerais. Já no sangue, o consumo de proteína, gordura, açúcar, leite e derivados mantém um pH acidificado, dificultando a ação e utilização dos minerais, inclusive do cálcio, ao mesmo tempo que aumenta sua excreção renal.
A fermentação de legumes, verduras e frutas (por boas bactérias e comensais) mantém um pH ácido intestinal, prejudicando o desenvolvimento de más bactérias e favorecendo a absorção do cálcio e dos outros minerais necessários para um bom funcionamento orgânico, inclusive manutenção da massa óssea.
No sangue, o metabolismo de legumes, verduras e frutas mantém o pH levemente alcalino, ideal para que as reações orgânicas aconteçam, favorecendo a disponibilidade do cálcio e, consequentemente, sua fixação nos ossos.
O maior problema do consumo de alta quantidade de cálcio, sem o equilíbrio com os demais nutrientes, principalmente o magnésio, é a possibilidade de micro calcificações a partir do cálcio circulante que não consegue fixar-se nos ossos, causando artrite, bursite, cálculos, nódulos, esporão.
É bom lembrar que para fazer o queijo, normalmente se concentra cerca de 10 vezes o leite, concentrando ainda mais as proteínas alergênicas e o cálcio, em detrimento do magnésio.
O pH normal do sangue varia entre 7,3 e 7,4, sendo levemente alcalino. É nesta faixa que as funções orgânicas podem ter um “ótimo” desempenho.
Pelo processamento que os alimentos sofrem durante a digestão, podem gerar substâncias alcalinas ou ácidas.
São alcalinos as frutas, os legumes e as verduras, na sua maioria.
São acidificantes o leite, o açúcar, as carnes, a cafeína, as gorduras, o álcool e aditivos químicos contidos em alimentos industrializados.
Talvez a resposta para a longevidade com qualidade de vida esteja em hábitos alimentares com menos produtos industrializados e aditivos químicos e o retorno ao consumo de alimentos mais saudáveis dados de presente pela “mãe” natureza.
Para começar seu dia de forma alcalina, ao invés de um copo de leite de vaca , tome um pouco de água com limão e depois tenha um café da manhã com frutas, ovos orgânicos ou caipiras, pão caseiro ou pão que estrague fácil sem conservantes, geléia de frutas orgânicas sem açúcar ou manteiga sem lactose, sementes como nozes, castanhas . E lembre-se de usar apenas o açúcar mascavo, demerara ou mel para adoçar.
Boa saúde e boa vida para você e sua família.
Referências Bibliográficas
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15- Murray, M. T. Encyclopedia of nutritional supplements. Rocklin: Prima Health,1996. 488p.
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